Reprodução Assistida

Confira a resolução do Conselho Federal de Medicina que atualmente regulamenta o assunto, com notas e grifos dos trechos pertinentes analisadas pela equipe da Maurício Lindoso Advocacia.

Confira também a entrevista realizada pela Coordenadoria de Editoria e Imprensa do STJ:

“RÁDIO
STJ Especial: as situações em que a barriga de aluguel é permitida no Brasil

Útero de substituição, doação temporária do útero ou, ainda, gestação de substituição. Todos esses termos dizem respeito ao que é popularmente conhecido como barriga de aluguel, um tema que, embora já tenha sido até enredo de novela, ainda é cercado de tabus. Para que a barriga de aluguel tenha amparo legal no Brasil, é preciso observar certas condições.
A Coordenadoria de Rádio do STJ preparou uma matéria especial sobre esse procedimento, adotado quando a mulher não tem condições de engravidar, mas ainda possui óvulos saudáveis capazes de gerar um bebê. Você conhecerá o caso de uma avó que emprestou o útero à própria filha, que tinha o grande sonho de ser mãe.

Clique aqui e ouça. “

Disponível em: < http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=113544&utm_source=agencia&utm_medium=email&utm_campaign=pushsco >

RESOLUÇÃO CFM Nº 2.013/13

Adota as normas éticas para a utilização das

técnicas de reprodução assistida, anexas à

presente resolução, como dispositivo

deontológico a ser seguido pelos médicos e

revoga a Resolução CFM nº 1.957/10.

O CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, no uso das atribuições conferidas pela

Lei nº 3.268, de 30 de setembro de 1957, alterada pela Lei nº 11.000, de 15 de

dezembro de 2004, regulamentada pelo Decreto nº 44.045, de 19 de julho de

1958, e Decreto n° 6.821, de 14 de abril de 2009, e

CONSIDERANDO a importância da infertilidade humana como um problema de

saúde, com implicações médicas e psicológicas, e a legitimidade do anseio de

superá-la;

CONSIDERANDO que o avanço do conhecimento científico já permite solucionar

vários casos de problemas de reprodução humana;

CONSIDERANDO que o pleno do Supremo Tribunal Federal, na sessão de

julgamento de 5.5.2011, reconheceu e qualificou como entidade familiar a união

estável homoafetiva (ADI 4.277 e ADPF 132);

CONSIDERANDO a necessidade de harmonizar o uso destas técnicas com os

princípios da ética médica;

CONSIDERANDO, finalmente, o decidido na sessão plenária do Conselho Federal

de Medicina realizada em 16 de abril de 2013,

RESOLVE:

Art. 1º Adotar as normas éticas para a utilização das técnicas de reprodução

assistida, anexas à presente resolução, como dispositivo deontológico a ser

seguido pelos médicos.

Art. 2º Revoga-se a Resolução CFM nº 1.957/10, publicada no D.O.U. de 6 de

janeiro de 2011, Seção I, p. 79, e demais disposições em contrário.

Art. 3º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 16 de abril de 2013

ROBERTO LUIZ D’AVILA HENRIQUE BATISTA E SILVA

Presidente Secretário-geral

NORMAS ÉTICAS PARA A UTILIZAÇÃO DAS TÉCNICAS DE

REPRODUÇÃO ASSISTIDA

I – PRINCÍPIOS GERAIS

1 – As técnicas de reprodução assistida (RA) têm o papel de auxiliar a resolução

dos problemas de reprodução humana, facilitando o processo de procriação.

2 – As técnicas de RA podem ser utilizadas desde que exista probabilidade efetiva

de sucesso e não se incorra em risco grave de saúde para a paciente ou o

possível descendente, e a idade máxima das candidatas à gestação de RA é de 50 anos.[1]

3 – O consentimento informado será obrigatório para todos os pacientes

submetidos às técnicas de reprodução assistida. Os aspectos médicos envolvendo

a totalidade das circunstâncias da aplicação de uma técnica de RA serão

detalhadamente expostos, bem como os resultados obtidos naquela unidade de

tratamento com a técnica proposta. As informações devem também atingir dados

de caráter biológico, jurídico, ético e econômico. O documento de consentimento

informado será elaborado em formulário especial e estará completo com a

concordância, por escrito, das pessoas a serem submetidas às técnicas de

reprodução assistida.[2]

4 – As técnicas de RA não podem ser aplicadas com a intenção de selecionar o

sexo (presença ou ausência de cromossomo Y) ou qualquer outra característica

biológica do futuro filho, exceto quando se trate de evitar doenças ligadas ao sexo

do filho que venha a nascer.[3]

5 – É proibida a fecundação de oócitos humanos, com qualquer outra finalidade

que não a procriação humana.

6 – O número máximo de oócitos e embriões a serem transferidos para a receptora

não pode ser superior a quatro. Quanto ao número de embriões a serem

transferidos faz-se as seguintes recomendações: a) mulheres com até 35 anos:

até 2 embriões; b) mulheres entre 36 e 39 anos: até 3 embriões; c) mulheres entre

40 e 50 anos: até 4 embriões; d) nas situações de doação de óvulos e embriões,

considera-se a idade da doadora no momento da coleta dos óvulos.

7 – Em caso de gravidez múltipla, decorrente do uso de técnicas de RA, é proibida

a utilização de procedimentos que visem a redução embrionária. [4]

II – PACIENTES DAS TÉCNICAS DE RA

1 – Todas as pessoas capazes, que tenham solicitado o procedimento e cuja

indicação não se afaste dos limites desta resolução, podem ser receptoras das

técnicas de RA desde que os participantes estejam de inteiro acordo e

devidamente esclarecidos sobre a mesma, de acordo com a legislação vigente.

2 – É permitido o uso das técnicas de RA para relacionamentos homoafetivos e pessoas solteiras, respeitado o direito da objeção de consciência do médico. [5]

III – REFERENTE ÀS CLÍNICAS, CENTROS OU SERVIÇOS QUE APLICAM

TÉCNICAS DE RA

As clínicas, centros ou serviços que aplicam técnicas de RA são responsáveis

pelo controle de doenças infectocontagiosas, coleta, manuseio, conservação,

distribuição, transferência e descarte de material biológico humano para a

paciente de técnicas de RA, devendo apresentar como requisitos mínimos:

1 – um diretor técnico responsável por todos os procedimentos médicos e

laboratoriais executados, que será, obrigatoriamente, um médico registrado no

Conselho Regional de Medicina de sua jurisdição;

2 – um registro permanente (obtido por meio de informações observadas ou

relatadas por fonte competente) das gestações, nascimentos e malformações de

fetos ou recém-nascidos, provenientes das diferentes técnicas de RA aplicadas na

unidade em apreço, bem como dos procedimentos laboratoriais na manipulação

de gametas e embriões;

3 – um registro permanente das provas diagnósticas a que é submetido o material

biológico humano que será transferido aos pacientes das técnicas de RA, com a

finalidade precípua de evitar a transmissão de doenças;

4 – Os registros deverão estar disponíveis para fiscalização dos Conselhos

Regionais de Medicina.

IV – DOAÇÃO DE GAMETAS OU EMBRIÕES

1 – A doação nunca terá caráter lucrativo ou comercial.

2 – Os doadores não devem conhecer a identidade dos receptores e vice-versa.

3 – A idade limite para a doação de gametas é de 35 anos para a mulher e 50 anos

para o homem.

4 – Obrigatoriamente será mantido o sigilo sobre a identidade dos doadores de gametas e embriões, bem como dos receptores. Em situações especiais, as

informações sobre doadores, por motivação médica, podem ser fornecidas

exclusivamente para médicos, resguardando-se a identidade civil do doador.

5 – As clínicas, centros ou serviços que empregam a doação devem manter, de forma permanente, um registro de dados clínicos de caráter geral, características fenotípicas e uma amostra de material celular dos doadores, de acordo com a legislação vigente.

6 – Na região de localização da unidade, o registro dos nascimentos evitará que um(a) doador(a) tenha produzido mais que duas gestações de crianças de sexos diferentes, numa área de um milhão de habitantes.[6]

7 – A escolha dos doadores é de responsabilidade da unidade. Dentro do possível,

deverá garantir que o doador tenha a maior semelhança fenotípica e imunológica

e a máxima possibilidade de compatibilidade com a receptora.

8 – Não será permitido ao médico responsável pelas clínicas, unidades ou

serviços, nem aos integrantes da equipe multidisciplinar que nelas prestam

serviços, participarem como doadores nos programas de RA.

9 – É permitida a doação voluntária de gametas, bem como a situação identificada

como doação compartilhada de oócitos em RA, onde doadora e receptora,

participando como portadoras de problemas de reprodução, compartilham tanto do

material biológico quanto dos custos financeiros que envolvem o procedimento de

RA. A doadora tem preferência sobre o material biológico que será produzido.

V – CRIOPRESERVAÇÃO DE GAMETAS OU EMBRIÕES

1 – As clínicas, centros ou serviços podem criopreservar espermatozoides, óvulos

e embriões e tecidos gonádicos.

2 – O número total de embriões produzidos em laboratório será comunicado aos

pacientes, para que decidam quantos embriões serão transferidos a fresco,

devendo os excedentes, viáveis, serem criopreservados.

3 – No momento da criopreservação os pacientes devem expressar sua vontade,

por escrito, quanto ao destino que será dado aos embriões criopreservados, quer

em caso de divórcio, doenças graves ou falecimento de um deles ou de ambos, e

quando desejam doá-los.

4 – Os embriões criopreservados com mais de 5 (cinco) anos poderão ser

descartados se esta for a vontade dos pacientes, e não apenas para pesquisas de

células-tronco, conforme previsto na Lei de Biossegurança.

VI – DIAGNÓSTICO GENÉTICO PRÉ-IMPLANTAÇÃO DE EMBRIÕES

1 – As técnicas de RA podem ser utilizadas acopladas à seleção de embriões

submetidos a diagnóstico de alterações genéticas causadoras de doenças.

2 – As técnicas de RA também podem ser utilizadas para tipagem do sistema HLA

do embrião, com o intuito de seleção de embriões HLA-compatíveis com algum

filho(a) do casal já afetado por doença, doença esta que tenha como modalidade

de tratamento efetivo o transplante de células-tronco ou de órgãos.

3 – O tempo máximo de desenvolvimento de embriões “in vitro” será de 14 dias.

VII – SOBRE A GESTAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO (DOAÇÃO TEMPORÁRIA DO

ÚTERO)

As clínicas, centros ou serviços de reprodução humana podem usar técnicas de RA para criarem a situação identificada como gestação de substituição, desde que exista um problema médico que impeça ou contraindique a gestação na doadora genética ou em caso de união homoafetiva.

1 – As doadoras temporárias do útero devem pertencer à família de um dos

parceiros num parentesco consanguíneo até o quarto grau (primeiro grau – mãe; segundo grau – irmã/avó; terceiro grau – tia; quarto grau – prima), em todos os casos respeitada a idade limite de até 50 anos.

2 – A doação temporária do útero não poderá ter caráter lucrativo ou comercial.

3 – Nas clínicas de reprodução os seguintes documentos e observações deverão

constar no prontuário do paciente:

– Termo de Consentimento Informado assinado pelos pacientes (pais genéticos) e

pela doadora temporária do útero, consignado. Obs.: gestação compartilhada

entre homoafetivos onde não existe infertilidade;

– relatório médico com o perfil psicológico, atestando adequação clínica e

emocional da doadora temporária do útero;

– descrição pelo médico assistente, pormenorizada e por escrito, dos aspectos

médicos envolvendo todas as circunstâncias da aplicação de uma técnica de RA,

com dados de caráter biológico, jurídico, ético e econômico, bem como os

resultados obtidos naquela unidade de tratamento com a técnica proposta;

– contrato entre os pacientes (pais genéticos) e a doadora temporária do útero (que recebeu o embrião em seu útero e deu à luz), estabelecendo claramente a questão da filiação da criança;

– os aspectos biopsicossociais envolvidos no ciclo gravídico-puerperal;

– os riscos inerentes à maternidade;

– a impossibilidade de interrupção da gravidez após iniciado o processo

gestacional, salvo em casos previstos em lei ou autorizados judicialmente;

– a garantia de tratamento e acompanhamento médico, inclusive por equipes

multidisciplinares, se necessário, à mãe que doará temporariamente o útero, até o

puerpério;

– a garantia do registro civil da criança pelos pacientes (pais genéticos), devendo esta documentação ser providenciada durante a gravidez;

– se a doadora temporária do útero for casada ou viver em união estável, deverá apresentar, por escrito, a aprovação do cônjuge ou companheiro.

VIII – REPRODUÇÃO ASSISTIDA POST-MORTEM

É possível desde que haja autorização prévia específica do(a) falecido(a) para o uso do material biológico criopreservado, de acordo com a legislação vigente.

IX – DISPOSIÇÃO FINAL

Casos de exceção, não previstos nesta resolução, dependerão da autorização do Conselho Regional de Medicina.

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS DA RESOLUÇÃO CFM nº 2.013/13

No Brasil, até a presente data não há legislação específica a respeito

da reprodução assistida. Transitam no Congresso Nacional, há anos, diversos

projetos a respeito do assunto, mas nenhum deles chegou a termo.

Considerando as dificuldades relativas ao assunto, o Conselho

Federal de Medicina produziu uma resolução – Resolução CFM nº 1.957/10 –

orientadora dos médicos quanto às condutas a serem adotadas diante dos

problemas decorrentes da prática da reprodução assistida, normatizando as

condutas éticas a serem obedecidas no exercício das técnicas de reprodução

assistida.

A Resolução CFM nº 1.957/10 mostrou-se satisfatória e eficaz,

balizando o controle dos processos de fertilização assistida. No entanto, as

mudanças sociais e a constante e rápida evolução científica nessa área tornaram

necessária a sua revisão.

Uma insistente e reiterada solicitação das clínicas de fertilidade de

todo o país foi a abordagem sobre o descarte de embriões congelados, alguns até

com mais de 20 (vinte) anos, em abandono e entulhando os serviços. A comissão

revisora observou que a Lei de Biossegurança (Lei no 11.105/05), em seu artigo

5º, inciso II, já autorizava o descarte de embriões congelados há 3 (três) anos,

contados a partir da data do congelamento, para uso em pesquisas sobre célulastronco.

A proposta é ampliar o prazo para 5 (cinco) anos, e não só para pesquisas

sobre células-tronco.

Outros fatores motivadores foram a falta de limite de idade para o

uso das técnicas e o excessivo número de mulheres com baixa probabilidade de

gravidez devido à idade, que necessitam a recepção de óvulos doados.

Esses aspectos geraram dúvidas crescentes oriundas dos

Conselhos Regionais de Medicina, provocando a necessidade de atualizações.

O somatório dos fatores acima citados foi estudado pela comissão,

em conjunto com representantes da Sociedade Brasileira de Reprodução

Assistida, da Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia e

da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana e Sociedade Brasileira de

Genética Médica, sob a coordenação do conselheiro federal José Hiran da Silva

Gallo.

Esta é a visão da comissão formada, que trazemos à consideração

do plenário do Conselho Federal de Medicina.

Brasília-DF, 16 de abril de 2013

JOSÉ HIRAN DA SILVA GALLO

Coordenador da Comissão de Revisão da Resolução CFM nº 1.358/92 –

Reprodução Assistida

[1] Aspecto polêmico. Discriminar a idade é algo sempre questionável ante a taxatividade e inobservância da pluralidade e diversidade humana.

[2] Direito a informação da paciente. Aspecto louvável da legislação e intrínseco a todos os atos médico, o paciente tem o direito de saber detalhadamente a que está sendo submetido, os riscos e informações pertinentes ao tratamento.

[3] Aspecto polêmico da resolução, mas coerente com a legislação brasileira contemporânea que veda a manipulação genética.

[4] Vedação diretamente relaciona ao caráter “abortivo” da redução embrionário, contudo, questionável na perspectiva sistêmica da reprodução assistida.

[5] Trecho coerente com a visão equitativa e constitucional da pessoa humana.

[6] Controle que visa a saudável diversidade genética da população.

Notas e grifos nossos, resolução disponível em: < http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/CFM/2013/2013_2013.pdf >

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